Então passou o Gafanhão a dividir o seu tempo entre a enxada e o ancinho do moliço, descendo à água, de manhã, para desengaçar algas e cavando a areia de tarde, para enterrá-las. Plantou mais couves e semeou mais feijões, iludindo hora a hora, a sua fome, com a perspectiva do dilúvio de fartura que havia de ter um dia.
Efectivamente, pensava ele, era infinitamente grande aquele areal que tinha em frente. E no dia em que o chão tivesse enegrecido, à força de moliço e lama, seria possível ter-se ali uma fortuna em terra onde colher novidade.
Sonhando este grande sonho. Tendo aninhada em si a ambição de vir a ter fartura e aquecido pela confiança segura no êxito, o homem teimava em cavar e plantar sempre, indo à Ria e revolvendo a areia, labutando apesar da fome, semeando pela décima vez onde nove, havia falhado uma cultura, sem desalento nem cansaço.
Quando a brancura do solo tinha ligeiramente escurecido, à força de adubo, as primeiras folhas da novidade manchavam de verde o chão, em volta da casa do homem, que sorria, triunfante, limpando o suor às costas negras da mão calejada.
E então veio de alguma parte outro homem, que se aliou ao primeiro. E chegou mais outro ao depois e um quarto, um quinto e uma família, e mais outras.
Ergueram-se mais casas ao longo dos braços da Ria, uma aqui, outra ali. Mais enxadas começaram a remover a areia e mais ancinhos de dentes bastos a arranhar o lodo do fundo do canal, arrancando moliço.
O Gafanhão organizava-se em exército indomável na luta contra a praga da areia. Teimoso por índole, jogou a cartada final: fixou-se. Casou e teve filhos. Construiu mais casas, mandou fazer mais enxadas de pá muito larga, muniu-se de ancinhos em maior quantidade e construiu moliceiros para a faina da Ria.
Eram então mais os braços. Homens e mulheres, filhos, genros e noras, tinham todos que amassar em suor a teimosa areia que se negava a produzir. E, enquanto uns labutavam em terra, cavando e semeando, outros queimavam ao sol iodado, sobre a água, os dorsos mal cobertos, dobrados sobre os cabos longos de pesados ancinhos a arrastar na lama.
Em volta da casa, ia o chão enegrecendo e já o cobria a verdura das folhas da novidade. Mas havia que alargar para dentro as culturas, que enegrecer mais areia, que fertilizar maior superfície de deserto.
Efectivamente, pensava ele, era infinitamente grande aquele areal que tinha em frente. E no dia em que o chão tivesse enegrecido, à força de moliço e lama, seria possível ter-se ali uma fortuna em terra onde colher novidade.
Sonhando este grande sonho. Tendo aninhada em si a ambição de vir a ter fartura e aquecido pela confiança segura no êxito, o homem teimava em cavar e plantar sempre, indo à Ria e revolvendo a areia, labutando apesar da fome, semeando pela décima vez onde nove, havia falhado uma cultura, sem desalento nem cansaço.
Quando a brancura do solo tinha ligeiramente escurecido, à força de adubo, as primeiras folhas da novidade manchavam de verde o chão, em volta da casa do homem, que sorria, triunfante, limpando o suor às costas negras da mão calejada.
E então veio de alguma parte outro homem, que se aliou ao primeiro. E chegou mais outro ao depois e um quarto, um quinto e uma família, e mais outras.
Ergueram-se mais casas ao longo dos braços da Ria, uma aqui, outra ali. Mais enxadas começaram a remover a areia e mais ancinhos de dentes bastos a arranhar o lodo do fundo do canal, arrancando moliço.
O Gafanhão organizava-se em exército indomável na luta contra a praga da areia. Teimoso por índole, jogou a cartada final: fixou-se. Casou e teve filhos. Construiu mais casas, mandou fazer mais enxadas de pá muito larga, muniu-se de ancinhos em maior quantidade e construiu moliceiros para a faina da Ria.
Eram então mais os braços. Homens e mulheres, filhos, genros e noras, tinham todos que amassar em suor a teimosa areia que se negava a produzir. E, enquanto uns labutavam em terra, cavando e semeando, outros queimavam ao sol iodado, sobre a água, os dorsos mal cobertos, dobrados sobre os cabos longos de pesados ancinhos a arrastar na lama.
Em volta da casa, ia o chão enegrecendo e já o cobria a verdura das folhas da novidade. Mas havia que alargar para dentro as culturas, que enegrecer mais areia, que fertilizar maior superfície de deserto.
(Continua).
Texto retirado do Arquivo do Distrito de Aveiro – Volume IX de 1943, de Joaquim Matias.
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