À ingénua simplicidade deste povo, como à de outros povos, tem andado sempre aliada uma grande dose de superstição, que nem o tempo, nem as admoestações de quem de direito, ainda conseguiram dominar completamente. Quantos e quantos casos de histerismo ou de outra qualquer doença são atribuídos a mau-olhado e inveja, ou às almas do outro mundo que querem missa ou cumprimento de promessas?
O que é mais para lamentar é que venham a ser vitimas inocentes de supostos malefícios os vizinhos do doente, o qual, mal avisado e numa má hora, foi até à bruxa, recebendo dela insinuações calculadas e manhosos, cujas consequências vieram pesar sobre esse vizinho que de nada era culpado.
Se por ventura a medicina não pode debelar a doença de uma pessoa de família supersticiosa, ou até de um animal, ou quando mesmo se não consulta o médico e a doença se prolonga demasiadamente, vai-se consultar a mulher de virtude ou adivinha tudo, e cujos oráculos são sentenças infalíveis, e cujas ordens se cumprem à risca ainda que para isso tenham que vencer-se grandes dificuldades.
Desde o momento da consulta, cortam-se relações com o vizinho caluniosamente incriminado e trata-se de uma defesa famosa contra os seus maus-olhados e malefícios. Ao pescoço dos adultos colocam-se argolas de aço, saquinhas (armações) com fragmentos de pedra de ara, de estola, de sanguinhos, etc. …contra as almas do outro mundo, contra a inveja, as pragas, etc. … Ao pescoço das crianças põem-se outros amuletos, como sejam o signo-saimão, figas corações de prata, pequenos chifres de azeviche, etc. …. contra as bruxas e maus-olhados.
A estes e outros amuletos. Como a certas orações sem sentido nem gramática, bem como a certos ritos destrambelhados e executados no momento da aplicação supersticiosa, presta-se uma veneração tão profunda e comovedora que a podemos considerar como um culto, que realmente é, muito extravagante e muito radicado.
(Continua)
Boas leituras
Rubem da Rocha
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