terça-feira, 28 de fevereiro de 2012

A Joana Maluca 6

(Continuação)
Era encantador e suave o declinar da vida desta nonagenária que, gulosamente, até ao último suspiro, ia fumando charutos sobre charutos sem queimar as barbas. Mas aquele roble gigantesco, aquele arcabouço forte, também devia tombar. Estava a soar a hora da partida que, porventura, a surpreendeu num momento em que ela menos desejaria. A fundadora da chamada capela da Maluca, que ela, para cumprir os preceitos da igreja e outras devoções particulares se abalançou, em 1848, a construir à sua custa; a mulher piedosa que se responsabilizou por conserva-la e dota-la, ainda que modestamente, com alfaias e tudo o mais que fosse preciso para o exercício do culto; a cristã que nos seus cantares pedia centenas de vezes um dote para quando morresse, não desejaria certamente morrer, como morreu, sem sacramentos. Assim o diz o assento de óbito. Altos desígnios da providência!
Deus que na sua misericórdia infinita acolhe sempre amorosamente as almas que na vida, até ao último suspiro, estão cheias de Ele, também devia estar ali presente naquela alma, numa Comunhão espiritual, intima, divina...
Os seus dias estavam finalmente contados, e numa manhã de inverno entregou-se santa nas mãos de Deus. Terminemos este esboço biográfico com assento de óbito, extraído de um livro de assentos de óbitos pertencente ao ano de 1878, arquivado na Repartição do Registo Civil de Ílhavo. É o seguinte:

- À margem - Nº 18 - Gafanha - Joana Rosa, a Maluca - Fiz oficios - No texto: - "Aos vinte oito dias de Janeiro de mil oito centos setenta e oito ás sete horas do dia na Gafanha desta freguezia e concelho de Ílhavo, diocese de Aveiro faleceo em sua morada, sem sacramentos, um individuo do sexo feminino por nome Joana Rosa, a Maluca, d'idade de noventa annos, casada com António dos santos Pata, em segundas núpcias, filha legitima de António Fernandes Cardoso e Luiza Gramata, naturais desta freguezia e lavradores. Não fez testamento, deixou filhos do primeiro matrimónio, mas não do segundo matrimónio e foi sepultada no cemitério. E para constar lavrei este duplicado que assigno. 
O Prior João André Dias." 

In "Monografia da Gafanha"  do Padre João Vieira Rezende. 

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