terça-feira, 9 de fevereiro de 2010

O Carnaval ou Entrudo na Gafanha da Nazaré

Nesta época que se aproxima de Carnaval ou Entrudo como diziam os nossos avós, transcrevo um pequeno texto da autoria da Sr.ª Professora Maria Teresa Filipe Reigota publicado no seu livro com o título “Gafanha…O que ainda vi, ouvi e recordo”.
Na Gafanha, quando o povo se referia ao Carnaval, dizia sempre “Entrudo”.
Eram os três dias que precediam a quarta-feira de Cinzas, começo da Quaresma: Domingo Gordo, Segunda e Terça-feira do Entrudo. Nestes dias faziam-se muitas brincadeiras, sem ferir ninguém.
Muitas pessoas disfarçavam-se vestindo roupas andrajosas, todas rotas, até esfarrapadas, que cobriam todo o corpo. O rosto era tapado com uma máscara “carantona”, feita de um bocado de pano velho, ou de papel, ou mesmo de serapelheira, onde tinham aberto o buraco para os olhos, para o nariz e para a boca. Na cabeça colocava-se um chapéu, o mais disforme possível, e as mãos cobriam-se com luvas ou até se pintavam com carvão – eram os “entrudeiros”.
Não tinham a preocupação de estar bem vestidos, representando uma ou outra personagem, mas em contrapartida tudo faziam para não serem reconhecidos. Iam por toda a Gafanha, assustando umas pessoas, brincando com outras, com caminhar diferente do seu habitual, fazendo-se de velhinhos agarrados a uma bengala ou a um pau de vassoura, manquejando, sei lá! Era o que lhes vinha à cabeça. Ao falar distorciam a voz, para nem isso dar a possibilidade de serem reconhecidos, por vezes até gaguejavam.
Batiam à porta de alguém e era-lhes servido um copo de tinto, davam dois ou três dedos de conversa, muitas vezes provocada pelos donos da casa para tentarem reconhecer o entrudeiro, mas sempre sem conseguirem. Prosseguiam o caminho, fazendo várias tropelias, daí aqueles ditos populares:
“É Entrudo vale tudo.”
“É Carnaval ninguém leva a mal.”
Recordo de no meu tempo de criança e jovem se fazerem as “cegadas”. Eram como que um teatro de rua, que satirizava algum acontecimento local que tivesse dado brado na terra, até mesmo as discussões e quezílias por causa das valas, dos caminhos, etc.…
Quase sempre estes grupos vinham dos lados da vila de Ílhavo, já disfarçados, e assentavam arraial onde eles entendiam que se juntava mais gente para apreciar o seu, chamemos-lhe, espectáculo.
Os gafanhões assistiam e gostavam de ver, comentando depois quem teria sido o ou a satirizada e, por um ou outro detalhe, quantas vezes se descobria.
Naqueles três dias havia que folgar, esquecer um pouco as mágoas. Curiosamente, os entrudeiros até conseguiam espalhar um pouco da sua, por vezes ruidosa, alegria, ou do seu passar sisudo e quieto que era motivo de chacota, pelo menos para a pequenada que se metia com eles. Ameaçavam os pequenos com a sua bengala ou com o seu varapau ou cajado, mas nunca lhes tocavam, era engraçado!
Actualmente nada disto se vê.

Eu, que sou um pouco mais novo que a autora, também me lembro de muitos grupos que passavam disfarçados, pelas principais ruas da Gafanha, com roupas em farrapos, que quase era impossível reconhecer as pessoas que as vestiam. Hoje, com a desconfiança que existe, já não achamos assim tanta piada com essas brincadeiras que se faziam, mas é bom recordar.
Boas leituras
Rubem da Rocha

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